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Você faz a diferença?

Posted: 24 de agosto de 2015 às 8:00 am   /   by   /   comments (0)

Reinaldo Polito*

Algumas pessoas conseguem se sobressair em atividades onde há muitos anos tudo era feito do mesmo jeito, do princípio ao final. Elas encontraram uma maneira toda peculiar de fazer a diferença colocando cores em cenários que sempre foram cinzentos.

Alguns ainda se lembram do Guarda Luizinho. Ele trabalhou como guarda de trânsito nos anos 1970 em frente ao prédio do Mappin, no cruzamento da Rua Xavier de Toledo com a Praça Ramos de Azevedo. Conseguiu se destacar e deixar seu nome na história por causa do seu jeito próprio de ser.

Numa atividade onde tudo é feito sempre da mesma maneira ele conseguiu fazer a diferença. Se um carro parasse sobre a faixa de pedestres, de maneira bem-humorada abria as portas dos dois lados do veículo e pedia que algumas pessoas passassem por dentro.

Se alguém avançasse a faixa de pedestres com o semáforo vermelho, ele pedia que voltasse para a calçada e, também de forma bem-humorada, mostrava um pequeno esqueleto humano de plástico, indicando que era assim que acabavam as pessoas que desrespeitavam os sinais de trânsito. Fez história. Fez a diferença.

Quantos professores que tivemos ensinando a mesma matéria e uns mais que outros se destacaram porque também fizeram a diferença. Contei já a história do professor de matemática Ulisses Ribeiro. Lecionando uma matéria que geralmente provocava muita resistência nos alunos conseguiu ser querido por todos.

Magrinho, sorridente, simpático sabia não só o nome de cada um dos alunos, como também de seus pais. Tinha interesse genuíno nos alunos. Quando percebia alguém desatento sacava um pedacinho de giz do bolso do jaleco e com pontaria impressionante acertava a testa do aluno. Todos riam, se divertiam e aprendiam.

Quando faleceu, a cidade de Araraquara, no interior de São Paulo, parou para homenageá-lo. Estavam reunidas ali várias gerações dizendo obrigado ao querido mestre. Sei que alguns patrulheiros de plantão começam a pensar que se um professor fizesse isso hoje, poderia ser processado por agressão. Pois é, nunca encontrei um ex-aluno do professor Ulisses que não fosse agradecido ou não gostasse dele. Fez história. Fez a diferença.

Recentemente recebi um e-mail de um garçom, Tinti Marco, que durante décadas também fez a diferença com seu trabalho preparando com maestria o lendário Fettuccine Alfredo, no não menos lendário Restaurante Alfredo Di Roma. Ele me escreveu para desejar um feliz 2013. Na verdade estava se despedindo de alguns clientes com quem teve contato durante toda sua vida de trabalho naquele restaurante.

Tinti Marco com sua roupa branca, gravata borboleta preta, calvo e sempre elegante preparava em rigorosos quarenta segundos os pratos que seriam servidos. Se fosse um casal de clientes, invertia o procedimento normal e construía sua própria tradição. Sorridente entregava a travessa original para a mulher desejando buona fortuna, e o segundo prato ao homem.

Ora, preparar um prato de fettuccine para misturar bem o macarrão com o molho branco não parece ser tarefa muito especial. Nas mãos de Tinti Marco, entretanto, era. Voltei a Roma recentemente para tratar da reedição do meu livro na Itália e fui ao Alfredo. Senti um vazio enorme, pois Tinti já havia se aposentado.

Tinti Marco soube fazer história e a diferença com seu trabalho. Assim como o Guarda Luizinho, o professor Ulisses Ribeiro e tantos outros que cruzam a nossa vida esse garçom fez com que uma atividade comum e exercida por tantos ao redor do mundo fosse destacada.

Essa é uma boa reflexão para todos nós. Afinal, desenvolvemos o nosso trabalho com a paixão devida para conseguirmos assim fazer a diferença? Ou apenas cumprimos com disciplina o que for preciso fazer? Sempre há tempo para uma mudança de postura. Talvez seja esse o caminho para que possamos nos sentir realizados e felizes.

SUPERDICAS DA SEMANA
– Não importa qual seja nossa atividade, sempre será possível desenvolvê-la de forma diferenciada

– Fazer bem o nosso trabalho não basta, precisamos ter excelência para fazermos a diferença

– Realizar com paixão uma atividade é quase sinônimo de felicidade
– Competência profissional e sentimento de realização nem sempre têm a ver com remuneração

Livro de minha autoria que ajuda a refletir sobre esse tema: ‘O que a vida me ensinou’, publicado pela Editora Saraiva, também no formato digital.

*Reinaldo Polito é mestre em ciências da comunicação, palestrante e professor de expressão verbal. Escreveu 20 livros que venderam mais de 1 milhão de exemplares